Yellowstone: O Melancólico Fim de uma Era
* Contém SPOILERS da quinta temporada da série Yellowstone
A quinta e última temporada de Yellowstone marca o fim de um fenômeno televisivo que vem desde 2018 modelando parte do ambiente cultural dos EUA e do mundo. Porém, ao invés de uma grandiosa e violenta batalha pela posse da terra, os episódios finais representam muito mais uma melancólica despedida de algo que parecia eterno. Mais do que algum grande inimigo, os personagens precisam enfrentar a implacável passagem do tempo.
O principal drama da quinta temporada teve início fora das telas. Depois de uma série de desentendimentos por causa do calendário de filmagens e de revisões salariais, o ator Kevin Costner, que interpretava o protagonista John Dutton, anunciou a sua saída da trama. Essa saída abrupta levou o criador Taylor Sheridan a fazer uma brusca mudança na história.
O problema é que a quinta temporada foi planejada para ser dividida em duas partes. Depois de filmar os oito primeiros episódios, que foram exibidos no final de 2022, a produção entrou em um hiato indeterminado. Isso prejudicou os planos de Costner, que já havia começado a produzir, escrever, dirigir e estrelar a saga de faroeste Horizon: Uma Saga Americana, planejada para resultar em quatro filmes.
Os dois lados negociaram por vários meses, mas jamais chegaram a um acordo. O resultado é que Costner não aparece nos seis últimos episódios da temporada, lançados no final de 2024. No início do nono episódio, vários personagens centrais recebem a notícia de que John Dutton foi encontrado morto em sua residência oficial como governador do estado de Montana.
Na série Succession, a morte do patriarca que era um dos protagonistas resulta na mais intensa sequência de episódios da produção, com várias facções lutando pelo “trono” vazio. Em Yellowstone, o acontecimento semelhante representa uma última oportunidade para Sheridan fazer o que ele já fazia nas temporadas anteriores: homenagear o estilo de vida da América rural, com suas belas paisagens e seus peculiares personagens.
Alguns dos seis episódios finais se passam em duas linhas do tempo. Seis semanas antes da morte de John Dutton, parte dos vaqueiros do rancho Yellowstone vão para o Texas com boa parte do gado, com o objetivo de evitar uma doença (brucelose bovina) encontrada nos pastos de Montana.
Como roteirista, Sheridan cria essa situação para poder realçar as diferenças entre a vida de vaqueiro em Montana e no Texas, que foi onde ele cresceu e onde chegou a trabalhar como vaqueiro nos finais de semana durante a adolescência. Isso também permite que ele inclua na trama várias participações especiais de pessoas reais que ele conhece no estado, como os vaqueiros do rancho 6666 (Four Sixes Ranch) e o fabricante de esporas Billy Klapper.
O próprio Sheridan volta para a frente das câmeras, mais uma vez interpretando o “excêntrico” treinador de cavalos Travis Wheatley, dono do Bosque Ranch na série. Na vida real, tanto o Four Sixes Ranch quanto o Bosque Ranch foram comprados por Sheridan depois que ele construiu seu império televisivo. Consequentemente, a produção de Yellowstone se tornou uma das fontes de renda dos dois estabelecimentos.
Na linha temporal do presente, Beth (Kelly Reilly), Kayce (Luke Grimes) e Rip (Cole Hauser) tentam entender e lidar com o falecimento do patriarca. A polícia conclui que a causa da morte foi suicídio, mas Beth não apenas duvida disso como tem quase certeza de que seu irmão adotivo Jamie (Wes Bentley) está envolvido no acontecimento.
Jamie acaba sendo o grande vilão dessa última temporada, apesar de suas ações serem muito mais reativas e medíocres do que planejadas e brilhantes. Desde a primeira temporada ele apresenta uma ambição sem direção que se torna rapidamente perigosa para a própria família. Ele não é um “mestre do crime”, mas sim uma pessoa insegura e covarde que sempre toma atitudes impulsivas e inconsequentes quando não consegue o quer ou quando se encontra em situações complicadas.
Sua ambição e sua necessidade de aprovação o levam a ser manipulado por vários opositores da família Dutton ao longo da série, especialmente quando ele se encontra frustrado e ressentido. A manipuladora da vez é Sarah Atwood (Dawn Olivieri), uma advogada da Market Equities. É ela quem contrata uma empresa de mercenários para assassinar John Dutton e fazer parecer um suicídio.
Dessa forma, são as inseguranças de Jamie que finalmente levam o lendário rancho Yellowstone ao seu fim.
Ao invés de suspense e ação, os últimos episódios de Yellowstone são marcados pelo drama e pela melancolia. Como nenhuma tragédia vem sozinha na trama da série, os personagens também precisam lidar com a morte de um dos vaqueiros que está presente desde a primeira temporada. Em muitos sentidos, o clima geral é de despedida, seja dos personagens, do histórico rancho ou do cada vez mais raro estilo de vida dos cowboys.
Manter o rancho se torna inviável principalmente devido ao imposto de herança que Beth e Kayce teriam que pagar, que deve corresponder a aproximadamente 40% do valor total da propriedade rural. A saída fácil seria vender a terra por um valor exorbitante para a Market Equities, que, paradoxalmente, a urbanizaria para atrair turistas em busca das paisagens naturais de Montana e para faturar bilhões de dólares todos os anos.
A solução encontrada é vender a terra por um preço muito menor para o líder indígena Thomas Rainwater (Gil Birmingham), o que diminui significativamente o valor líquido do imposto de herança e garante que a terra não será asfaltada para receber turistas. Assim, as terras do Yellowstone finalmente voltam para os descendentes de seus ocupantes originais.
Para o espectador, a saga do rancho Yellowstone nos lembra da grandeza do tempo e da finitude das empreitadas humanas. Na minissérie 1883, nós pudemos ver como a família Dutton conseguiu a duras penas chegar na região onde o rancho seria fundado. Na série 1923, acompanhamos a épica batalha da geração seguinte para não perder a propriedade da família.
Desde as primeiras temporadas de Yellowstone, John Dutton dá a entender que ele sabe que o rancho não vai durar para sempre. Sua maior preocupação é que ele não seja o Dutton que perde o legado da família, e esse objetivo é atingido. São seus filhos que precisam abrir mão do rancho para que, de alguma forma, ele continue existindo. O legado é mantido não em uma propriedade rural, mas em todas as vidas que foram transformadas e em todas as memórias que foram criadas no local.
As cenas iniciais de 1883 contam com a narração da personagem Elsa Dutton (Isabel May), jovem cuja vida e cuja prematura morte marcaram a fundação do rancho da família. Sua narração volta nos momentos finais do último episódio de Yellowstone, concluindo uma violenta saga de 141 anos. O túmulo de Elsa foi o primeiro a ser cavado no cemitério privado da família, e o de John Dutton talvez seja o último.