Os 15 (ou mais) melhores filmes que assisti em 2016
5. Testemunha de Acusação (1957)
Alguns filmes depositam todas suas fichas em um final surpreendente e acabam se tornando uma experiência cinematográfica incompleta, exigindo que o espectador apenas “aguente” a maior parte da narrativa e só apresentando algo realmente interessante ao fim da projeção. Testemunha de Acusação está longe de ser um desses casos. Desde os primeiros momentos desse clássico, somos cativados por uma série de personagens e diálogos que por si só justificam a existência do filme.
Seu primeiro ato já é uma experiência cinematográfica completa. Quando a grande problemática do filme é apresentada (a supostamente fiel esposa de um homem acusado de assassinato deixa todos chocados ao testemunhar pela promotoria ao invés da defesa), o espectador é levado cada vez mais fundo nos vários mistérios apresentados pela trama.
Flashbacks, revelações e algumas reviravoltas depois, somos agraciados com um final que é chocante menos pelos acontecimentos em si, e mais por evidenciar o assombroso talento da lendária atriz Marlene Dietrich. Se a atuação de Charles Laughton como o advogado de defesa é hipnotizante, a de Dietrich beira o sobrenatural. Depois da grande revelação, tudo o que o espectador pode fazer é rever algumas cenas e tentar entender como aquela atuação foi possível.
Um outro clássico filme de tribunal que assisti no ano passado foi O Vento Será Tua Herança. Nele, acompanhamos uma esquentada batalha de argumentos quando um professor de uma pequena e religiosa cidade americana vai a julgamento pelo crime de “ensinar a Teoria da Evolução” na escola local. Ao contrário do que se pode pensar, a história, que é baseada em um julgamento real e já foi readaptada inúmeras vezes, não apresenta um embate entre a ciência e a religião, mas sim entre a razão e o fundamentalismo. A mensagem final é de que a ciência não necessariamente invalida as crenças religiosas, assim como as crenças religiosas não invalidam a ciência. Esse é o tipo de filme que ainda vai levar muito tempo até envelhecer.
4. Aquarius (2016)
O cinema como entretenimento nos permite sair de nossas realidades e “viver” experiências com as quais não podemos (ou não queremos) lidar em nossa vida diária: ação, suspense, comédia, terror, etc. Porém, como arte, ele pode nos convidar para uma reflexão sobre a nossa própria realidade, ao invés de nos afastar dela. E é isso que Aquarius faz.
Quando vemos parte de nossas personalidades e de nosso próprio dia a dia na tela do cinema, somos forçados a refletir sobre situações que sequer registramos em nossa vida diária. Quando vemos na tela uma cultura e costumes que nos são tão familiares, somos forçados a realmente vê-los como cultura e costumes, ao contrário de pensarmos apenas que “é assim que a vida é”. Mais do que expor uma realidade, Aquarius permite que o espectador se “exponha”, pois esse é o tipo de obra sobre a qual uma análise reflete mais sobre quem a faz do que sobre a obra em si.
Dentre as muitas análises possíveis, fiz a minha aqui.
3. Mensageiro do Diabo (1955)
Como escrevi anteriormente, o cinema tem o poder de nos tirar de nossa realidade e nos conduzir por experiências que vão além de nossa vida normal. Mas e se uma dessas experiências for um completo pesadelo? Ainda que, ao fim, Mensageiro do Diabo nos dê um fio de esperança, toda a dor e sofrimento causados ao longo do filme nos faz pensar se essa esperança é o suficiente. Talvez não seja esperança que essa história provoque no espectador, mas sim uma poderosa confusão de sentimentos que coloca o seu lado mais otimista numa batalha feroz com seu lado mais sombrio. Se filmes como A Bruxa e o O Lamento exploram nossos primordiais medos de origem religiosa, Mensageiro do Diabo explora e concretiza alguns de nossos medos mais infantis, chegando a ponto de provocar um pouco de pavor existencial.
Nesse que é um dos maiores clássicos do cinema noir (e do cinema em geral), um ardiloso e misógino fanático religioso passa a perseguir uma pobre família cujo pai acaba de morrer na prisão depois de deixar escondida uma pequena fortuna, fruto de um assalto a banco. A fragilizada viúva não faz ideia do que está acontecendo, enquanto as crianças passam a ser incessantemente perseguidas para que revelem a localização do dinheiro.
A partir de determinado ponto, fica claro que os dois irmãos, um menino e uma menina, tem apenas um ao outro para tentar escapar das garras de um manipulador e cruel psicopata. E é daí que o filme extrai o mais puro terror psicológico. Aqui, o “monstro” se esconde em plena vista, usando não apenas todo seu carisma e simpatia, mas também a chamada “palavra de Deus”, convencendo jovens, velhos e adultos de que ele é uma das melhores criaturas que já pisou nessa Terra.
Toda essa “escuridão” é pontuada por momentos do mais negro humor, além de um visual tão poético quanto gótico. Único filme dirigido pelo ator Charles Laughton (que atua em Testemunha de Acusação, nossa 5ª posição), Mensageiro do Diabo também é único tanto em seu gênero e quanto no efeito que causa no espectador. Talvez esse seja o mais “dark” dos filmes.
2. A Qualquer Custo (2016)
Esse faroeste faz uso de diversos elementos do gênero e acaba entregando um dos melhores filmes do ano. Da minha crítica:
Mesmo sendo um trágico drama com elementos de suspense, o filme possui diversos momentos engraçados e consegue até mesmo incluir elementos de cultura pop na narrativa, fazendo referência a clássicos do faroeste. O fator cool também está em várias das cenas de ação, mas sempre sem retirar o peso dramático dos acontecimentos. O tenso diálogo final poderia ter saído de um filme de Tarantino ou mesmo de Sergio Leone, com direito a um caubói partindo em direção ao pôr-do-sol na última cena.
Inspirado pelo filme, fiz uma lista dos melhores faroestes produzidos nesse século e o coloquei no topo. Outro ótimo faroeste que assisti no ano passado e que também está na lista de melhores do século é Rastro de Maldade. Esse parece ser um faroeste mais típico, mas em seu ato final incorpora elementos de puro terror, tanto físico quanto psicológico. Uma determinada cena de execução deve ser uma das mais brutais da história do cinema e desafia o espectador a continuar olhando pra tela. Não é pra qualquer um.
1. A Chegada (2016)
Antes de assistir a ficção científica A Chegada, li o conto no qual ela é baseada, o que acabou estragando um pouco a experiência. Entretanto, esse conhecimento prévio também serviu para avaliar o quão fiel ele é. A fidelidade ao conto era importante não devido aos acontecimentos (e vários detalhes e acontecimentos são completamente alterados no filme), mas sim devido à experiência que é ler o material original, que foi perfeitamente traduzida para a linguagem cinematográfica pelo experiente diretor. Como escrevi em minha crítica:
Cada memória da relação entre ela e a filha é tão tocante quanto trágica, pois já sabemos como a história delas irá terminar. Essas memórias são apresentadas com maestria pelo diretor Denis Villeneuve, que, com A Chegada, se consolida como um dos melhores e mais provocantes diretores da atualidade. Qualquer um de seus filmes mais recentes (Incêndios, Os Suspeitos, O Homem Duplicado, Sicario – Terra de Ninguém) pode ser considerado uma obra-prima sob algum ponto de vista, mas A Chegada é uma obra-prima sob qualquer aspecto. A fantástica montagem desse filme o torna uma experiência cinematográfica única, combinando, de forma sutil e graciosa, a ficção científica com uma história genuinamente emocionante (…). A grande revelação ao final de A Chegada é comparável apenas à terrível revelação que vemos em Incêndios, o que é algo notável.
A Chegada vai estar no topo de muitas listas de melhores filmes do ano de 2016 e, possivelmente, já está no rol dos maiores filmes de ficção científica de todos os tempos.