Crítica: Planeta dos Macacos – A Guerra
War for the Planet of the Apes, EUA, 2017
Filme fecha com chave de ouro nova trilogia da franquia Planeta dos Macacos
★★★★☆
Em Planeta dos Macacos: A Guerra vemos o fim do conflito iniciado tragicamente em Planeta dos Macacos: O Confronto. Mais que isso, vemos a conclusão da saga do herói Caesar (Andy Serkis), que ao longo dos três filmes (o primeiro é Planeta dos Macacos: A Origem) toma proporções épicas. Apesar de já não mostrar sinais de sua infância entre humanos, ele ainda é assombrado pelos atos do macaco Koba (Toby Kebbell), um odioso radical que ele teve que derrotar em uma luta mortal pela liderança da comunidade de símios.
Dois anos depois dos eventos do filme anterior, Caesar continua buscando estabelecer a paz entre homens e macacos, mas um ato de guerra por parte do exército liderado pelo Coronel (Woody Harrelson) o deixa sedento por vingança. Sua busca por retribuição é um dos principais motores da narrativa, fazendo-o tomar decisões mais características de um Koba do que de um líder responsável. A comunidade paga caro por suas escolhas e ele tem uma única chance para evitar que uma tragédia ainda maior os atinja.
Uma vez que esse capítulo é focado na jornada de Caesar e no aprisionamento e escravização dos macacos pelo Coronel, o filme acaba tendo menos ação que o tenso e explosivo O Confronto. Isso dá espaço para um ainda mais profundo desenvolvimento dos personagens, tanto os já conhecidos quanto os aqui introduzidos. Inicialmente, Caesar é acompanhado apenas pelo seu “estado-maior”, formado por Maurice (Karin Konoval), Luca (Michael Adamthwaite) e Rocket (Terry Notary). Posteriormente, se juntam a eles a criança humana Nova (Amiah Miller) e o então isolado símio que se chama apenas de Macaco Mau (Steve Zahn).
Nova traz à tona os vestígios de bondade e ternura ainda existentes em Caesar, e, ao longo da trama, sua inocência representa a esperança de paz e coexistência entre macacos e humanos. Já Macaco Mau é um dos mais ricos personagens apresentados na trilogia, com sua cômica excentricidade servindo como um alívio para o espectador, apesar da trágica história que precedeu sua agora melancólica e isolada existência.
Ele também é uma das principais evidências do sucesso da técnica de captura de movimentos usada na produção, com as complexas expressões faciais do ator Steve Zahn sendo transmitidas para o personagem gerado digitalmente sem perda do impacto emocional, como pode ser visto nesse clipe.
A outra grande adição ao rol de personagens é o líder do exército humano, que é chamado apenas de O Coronel. Seu desespero e sua loucura são tão autênticos quanto assustadores. Diante da possibilidade da erradicação da raça humana pelo mesmo vírus que deu inteligência aos macacos, ele abandona os vínculos afetivos e os preceitos morais que consideramos partes vitais da nossa humanidade, passando a tomar decisões sempre orientadas pelo desejo de sobrevivência. A ele se aplica o mesmo questionamento que levantei na crítica de Ao Cair da Noite: até que ponto vale a pena sobreviver se a sua sobrevivência depende da realização de atos monstruosos?
Nele também percebemos a irracionalidade das “frias” decisões tomadas em nome da sobrevivência: erradicar os macacos dificilmente vai resolver o problema do vírus que está destruindo a humanidade. O que O Coronel falha em perceber é que, uma vez que o vírus já pode ser transmitido entre humanos, os macacos já não são (e talvez nunca foram) o principal vetor. Uma atitude mais racional seria encontrar cientistas e/ou profissionais de saúde que pudessem ajudar na tomada de medidas pra evitar o contágio ou mesmo na pesquisa por uma cura, se os recursos disponíveis assim permitissem.
Ao invés disso, O Coronel recorre às medidas mais violentas possíveis, mostrando que, ao contrário do que ele prega, é a sua emotividade (ele também sofreu uma pesada tragédia pessoal), e não sua racionalidade, que está sendo o principal motivador de suas decisões. O mesmo pode ser dito de populares medidas políticas que vem sendo tomadas atualmente em todo globo, como a defesa do fechamento de fronteiras para imigrantes ou da execução sumária de bandidos nas ruas das grandes cidades. Como aquelas tomadas pelo Coronel, essas medidas partem da falácia de que uma determinada parte da população (geralmente segregada por critérios étnicos ou sociais) é culpada pelos problemas do país, e eliminá-la deve resolver a situação.
Mesmo com tantos detalhes e interessantes arcos emocionais, o diretor Matt Reeves não abre mão de presentar o espectador com belas e introspectivas tomadas, tanto de paisagens quentes quanto de montanhas cobertas de neve, e geralmente ancoradas nas ótimas interpretações de todo elenco, especialmente Andy Serkis. Apesar disso, e das 2 horas e 20 minutos de duração, a narrativa se move de forma rápida e habilidosa, deixando a impressão de que nenhum minuto foi desperdiçado na projeção.
Com um notável conjunto de personagens e roteiros que não tem medo de fazer o telespectador pensar, essa nova trilogia do Planeta dos Macacos torna a mostrar que nem todo blockbuster do verão americano precisa priorizar o fator “diversão” para ser bem sucedido. Inclusive, vários críticos tem apontado a semelhança entre Planeta dos Macacos: A Guerra e os clássicos blockbusters bíblicos da era de ouro hollywoodiana: o povo escravizado enquanto busca sua terra prometida, o herói amarrado em uma cruz e a traição vinda de pessoas próximas são apenas algumas das referências. Esse é o tipo de estória que nunca perde a grandiosidade.