Crítica: Neymar – O Caos Perfeito

Neymar: The Perfect Chaos, EUA, 2022



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★★★★☆


Era de se esperar que a minissérie documental Neymar: O Caos Perfeito mostraria que a fama e o sucesso de Neymar Jr. não são frutos apenas das decisões que ele toma dentro de campo, mas também das decisões tomadas por ele e por seu pai fora dele. Porém, a produção vai ainda mais fundo que isso, mostrando a gigantesca estrutura de marketing e agenciamento (na forma da NR Sports) montada para gerenciar tanto a carreira quanto a imagem do jogador. Além de servir como plataforma para Neymar se apresentar como ser humano e tentar controlar sua narrativa, a minissérie também serve como um raro e interessante olhar sobre a indústria das celebridades.

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Os três episódios de O Caos Perfeito vão tão fundo que chegam a jogar por terra o lado “conto de fadas” da história. A trajetória de Neymar Jr. pode inspirar muitos garotos a tentarem se tornar grandes astros do futebol, mas esse documentário deixa claro que ser muito bom de bola não é o suficiente. A técnica e o talento do jovem jogador levaram muitas pessoas a prestarem atenção nele, mas foi seu pai quem trabalhou para transformar essa atenção em um império do marketing esportivo e consolidá-lo como uma celebridade global.

O pai e empresário Neymar da Silva Santos merece seu próprio documentário, ou mesmo um drama nos moldes do recente King Richard: Criando Campeãs. O ex-pedreiro e ex-jogador de futebol utilizou tudo o que aprendeu durante sua complicada trajetória esportiva para moldar a carreira do filho. Não é que Neymar Jr. pôde contar com a sorte ou que as coisas foram acontecendo naturalmente, mas sim que seu pai tinha uma clara visão estratégica e, aparentemente, bons instintos para os negócios. A estrutura que ele monta e as decisões que ele toma desde cedo são impressionantemente profissionais.

Um dos aspectos mais inteligentes desse gerenciamento é que o pai permitiu que Neymar mantivesse sua autenticidade e tomasse suas próprias decisões, ao invés de tentar controlar as decisões do atleta levando em contas apenas a marca “Neymar Jr.” (que tem seu próprio website). Isso deixou espaço para que o jogador cometesse seus próprios erros, mas também pode ter contribuído para o lado mais imaturo e inconsequente do Neymar adulto. O documentário também deixa transparecer que está cada vez mais difícil conciliar a “marca” com o ser humano real.

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Do ponto de vista de Neymar Jr., a mídia e o público deveriam se importar apenas com o que ele faz e com os resultados que ele alcança dentro de campo, o que significaria uma separação entre sua vida pessoal e sua vida profissional. O que ele não entende é que nem a mídia e nem o publico têm interesse em fazer essa separação. Para o resto do mundo, existe apenas um Neymar Jr., e tudo o que ele faz em sua vida pessoal é inseparável do que ele faz em sua vida profissional. Isso faz com que ele pareça estar vivendo em uma espécie de BBB há mais de dez anos, com todos os detalhes de sua vida sendo constantemente analisados.

Tudo isso faz com que Neymar: O Caos Perfeito não seja apenas um documentário esportivo, mas também um documentário sobre o mundo dos negócios e das celebridades no esporte. Algumas das cenas são dignas da série Succession, especialmente quando o atleta entra em conflito com o pai. Enquanto o Neymar pai se preocupa com o futuro e com sua sucessão no império que ergueu, Neymar Jr. se mostra relutante em assumir as responsabilidades típicas de uma grande empresa. Por enquanto, ele parece interessado em viver a vida como sempre viveu, se preocupando apenas em jogar futebol e se divertir. Porém, nada é para sempre.

Obviamente, Neymar: O Caos Perfeito também mostra os destaques esportivos da trajetória do atleta e toda a pressão com a qual ele precisa lidar. O episódio final é focado em suas temporadas no Paris Saint-Germain e em sua complicada relação com o clube e com a torcida, além dos impactos causados pela pandemia de COVID-19.

Consequentemente, a minissérie não apenas conta uma história que ainda não acabou de acontecer, mas também acaba se tornando parte da história que está sendo contada. Como o próprio atleta diz, um dos motivos para a realização dessa produção é a consolidação de seu legado, permitindo que ele e seu pai compartilhem seus próprios pontos de vista sobre suas trajetórias ao longo dos últimos quinze anos.

Ainda assim, esse não é um documentário formatado apenas como uma homenagem, como foi o caso de Pelé. Com a ajuda de uma ótima edição e de uma ótima trilha sonora, a produção traça um complexo retrato não apenas de um jovem atleta, mas também do mundo ao seu redor. Graças a ela, é possível ter uma ideia mais clara da realidade de sua situação e dos bastidores de sua estelar existência.