Crítica: Irmãs Separadas
Im Feuer, Alemanha/Grécia, 2020
Drama faz um pequeno retrato da realidade emocional de pessoas deslocadas de seus países
★★★★☆
Com uma história simples e abrangente, Irmãs Separadas é bem sucedido em mostrar o drama humano e familiar por trás da luta dos curdos no Oriente Médio. Os maiores momentos aqui não são os mais dramáticos ou explosivos, mas sim aqueles nos quais a protagonista Rodja (Almila Bagriacik) está silenciosamente refletindo sobre sua família, sua nação e sua identidade. A trama gira menos em torno de sua jornada física e mais em torno de sua jornada emocional, focando nas conexões que ela estabelece ou reestabelece ao longo do caminho.
Morando na Alemanha desde pequena e membro do exército do país, ela faz o máximo possível para que sua recém-chegada mãe, Ferhat (Maryam Boubani), se adapte à nova vida. Porém, o conflito que segue no Curdistão e a filha que ficou para trás não permitem que Ferhat se tranquilize, levando Rodja a solicitar uma transferência para o Iraque na esperança de localizar a irmã.
Ela é uma adição perfeita para um grupo que está tentando treinar uma das Unidades de Proteção das Mulheres, que fazem parte das forças curdas abandonadas pelos EUA em 2019. A situação que Rodja encontra é a de um pelotão inteiramente masculino do exército alemão tentando treinar as guerrilhas inteiramente femininas de acordo com o típico modelo hierárquico militar, que elas rejeitam inteiramente. Do ponto de vista estratégico, o modelo planificado de comando não parece uma boa ideia, mas ele foi bom o suficiente para garantir importantes vitórias curdas sobre o Estado Islâmico.
Por meio do conflito de identidade da protagonista, Irmãs Separadas toca em importantes laços para toda a população da etnia curda. Por um lado, há o óbvio laço com a terra natal e com a luta pela formação de um país de identidade curda, o que evitaria que essa população seja tratada como minoria nos países onde vivem. Por outro lado, Rodja reconhece o esforço feito pelo Estado alemão para receber e integrar esses refugiados, ainda que ela ainda tenha que lidar com o machismo e outros problemas presentes nas sociedades ocidentais. Ao fim, ela está mais emocionalmente conectada tanto com o Curdistão quanto com o exército alemão.
E no centro de tudo isso está sua conexão com a irmã que ficou para trás, reforçando o lado humano daquela situação geopolítica. Em meio a ela, as fronteiras entre escolhas pessoais e deveres civis se tornam porosas. Não há boa escolha entre fugir e construir uma nova vida no ocidente ou ficar e lutar para proteger a frágil nação onde nasceram. O correto seria que ninguém jamais tivesse que tomar esse tipo de decisão. Tanto os refugiados quanto as guerrilheiras estão lutando pelo futuro.
Sutil mas poderoso, Irmãs Separadas consegue não apenas tratar todos esses temas em apenas noventa minutos de projeção, mas também fazê-lo sob o ponto de vista de um drama familiar íntimo e tocante. As personagens são bem construídas e as nuances de suas situações bem exploradas, resultando em um pequeno mas representativo retrato das atuais populações refugiadas do mundo.
* Assistido online na 44ª Mostra Internacional de Cinema de São Paulo