Crítica: Acompanhante Perfeita
Companion, EUA, 2025
Trailer · Letterboxd · IMDB · RottenTomatoes
★★★★☆
Para começar, eu vou sim dizer que Acompanhante Perfeita é “muito Black Mirror“. Dito isso, o que realmente se destaca aqui é que o filme adiciona mais uma camada no “universo cinematográfico dos romances entre pessoas e inteligências artificiais”. Além de enriquecer e complementar as questões abordadas em filmes como Ela, Blade Runner 2049 e O Homem Ideal, a trama surpreende e diverte quando entra no modo Ex Machina, Westworld e M3gan.
Porém, apesar de todas essas referências de ficção científica, a história também possui muitos paralelos com o recente suspense psicológico Jogo Justo. Nos dois casos, o relacionamento no centro da trama é despedaçado pelas inseguranças de um homem. Quando a situação começa a sair do controle desses personagens (ou apenas ir em uma direção que os deixa frustrados), eles vão progressivamente se tornando cada vez mais tóxicos e perigosos.
A diferença é que em Acompanhante Perfeita o personagem Josh (Jack Quaid) já dá vários sinais preocupantes antes mesmo da coisa começar a desandar. O fato de que ele está perfeitamente confortável com seu relacionamento com a androide Iris (Sophie Thatcher), sobre a qual ele tem total controle, já revela um nível preocupante de narcisismo.
O casal formado por Josh e Iris projeta uma imagem de equilíbrio e normalidade, com Iris mostrando um alto grau de admiração (ou mesmo devoção) ao namorado. Porém, uma vez que a realidade da situação fica clara, percebe-se que a imagem projetada escondia o fato de que Iris não possui poder de decisão e sua existência gira em torno de manter Josh feliz e satisfeito.
É interessante notar que, mesmo sabendo que Iris está apenas seguindo sua programação, parte de Josh realmente acredita que é amado e respeitado pela androide. Para ele, a performance de Iris é suficiente. Mesmo sabendo que não é amado, ele se sente amado. Assim como O Homem Ideal, o filme levanta questionamentos como: se o amor é percebido por meio das ações e das palavras da outra pessoa, como diferenciar o sentimento real de uma performance fictícia?
As surpresas e reviravoltas presentes em Acompanhante Perfeita garantem que a premissa seja explorada sob diferentes ângulos.
A história realça o fato de que o problemático relacionamento entre Iris e Josh possui muitos paralelos com relacionamentos abusivos da vida real. Mesmo quando ele já não consegue controlar Iris por meio de comandos de voz, Josh ainda exerce poder sobre ela graças aos sentimentos que ela está programada para sentir em relação a ele.
No mundo real, isso ocorre por meio da dependência emocional. A jornada de Iris é justamente a jornada de uma mulher que percebe que está em um relacionamento abusivo e tenta desesperadamente escapar. Parte de seu esforço é para superar os sentimentos que a mantinham nessa situação, apesar de ainda senti-los e de ter boas (e fictícias) memórias ao lado de Josh.
Os demais personagens ajudam a explorar outros aspectos dessa situação. No caso de Kat (Megan Suri) e Sergey (Rupert Friend), ela se vê apenas como mais um acessório que foi “adquirido” pelo namorado, fazendo parte de sua coleção de itens de luxo. Já Eli (Harvey Guillén) e Patrick (Lukas Gage) parecem formar um casal perfeito, mas o mesmo podia ser dito sobre Josh e Iris no início do filme.
Outros aspectos da trama de Acompanhante Perfeita mostram como androides como Iris podem ser utilizados por seus proprietários para cometer crimes ou fazer outras coisas indesejadas. A devoção que Iris sente por Josh é desprovida de desconfiança ou pensamento crítico, permitindo que ela seja utilizada como uma obediente guarda-costas ou faz-tudo. Em seu estado normal, o único vestígio de ética que ela possui está nas travas presentes na sua programação, que parecem seguir as leis da robótica.
Como terror, Acompanhante Perfeita lembra os ótimos Você é o Próximo e Casamento Sangrento, filmes nos quais as “mocinhas” precisam lutar para sobreviver. Esse pode não ser um filme ideal para uma noite romântica, mas ele apresenta uma história que inspira as pessoas, independente de gênero ou orientação sexual, a refletirem sobre os papéis que elas exercem em seus relacionamentos.