Crítica: Succession – 3ª Temporada
Succession – Season 3, EUA, 2021
HBO Max · Trailer · Filmow · IMDB · RottenTomatoes
★★★★★
Depois do final da segunda temporada de Succession, os fãs esperavam uma terceira temporada de guerra total. Porém, ao invés de priorizar disputas financeiras e jurídicas, Jesse Armstrong e os demais roteiristas preferiram priorizar as disputas familiares e o aprofundamento dos personagens. Quando se espera que a trama evolua da forma mais dramaticamente excitante, ela evolui da forma mais psicologicamente realista, indo além de um mero impacto emocional e ressonando visceralmente com as fragilidades psicológicas do espectador.
Isso pode ter frustrado parte do público, com várias pessoas reclamando da falta de “avanço” na história. Ao invés disso, essa temporada preferiu fazer um “mergulho” na psique dos irmãos Roy. Desde o primeiro episódio, as imagens que eles têm de si próprios começam a desmoronar, levando cada um deles a perder o controle e a ir longe demais ao longo dos episódios seguintes. Apenas Connor Roy (Alan Ruck) continua perdido em seu mundo de fantasia, o que poderá gerar consequências bem previsíveis nas próximas temporadas.
A falta de “avanço” mencionada por alguns fãs ocorre pelo caráter repetitivo das ações dos irmãos. Kendall (Jeremy Strong) dá sinais de que irá, mais uma vez, se precipitar e sabotar os próprios planos; Siobhan (Sarah Snook) ainda não entendeu que seu idealismo político não é bem-vindo nos arredores de seu pai; e Roman (Kieran Culkin) segue inseguro tanto em relação à saúde do pai quanto em relação a seus próprios problemas edipianos, levando-o a tentar compensar essas inseguranças com uma dose extra de hostilidade dirigida aos irmãos.
Isso é um reflexo da abordagem adotada pelo criador da série, Jesse Armstrong. Nessa entrevista sobre o último episódio da temporada, ele diz que não acredita que as pessoas realmente possam mudar. Para ele, o que muda são as circunstâncias nas quais elas estão, o que pode levá-las a tomar atitudes diferentes das do passado, ainda que essencialmente ainda sejam as mesmas pessoas. Dessa forma, a natureza cíclica do comportamento dos personagens de Succession é um reflexo da natureza cíclica do comportamento das pessoas na vida real.
Nessa outra entrevista, Armstrong diz que para ele e os demais roteiristas é mais importante garantir um senso de realismo do que tentar encaixar piadas ou montar um grande arco dramático. Ou seja, eles estão mais interessados em capturar o que pessoas reais fariam naquelas situações do que em tentar prover cenas engraçadas ou emocionantes. Assim como na vida real, o humor e o drama emergem do comportamento das pessoas enquanto lutam para conseguir aquilo que desejam.
O patriarca Logan Roy (Brian Cox) parece estar acima disso tudo, mas ele também age com base em padrões que devem ter surgido ainda durante sua juventude. Tanto ele quanto Caroline Collingwood (Harriet Walter) veem os filhos desde cedo como mais três players no jogo de poder da família, projetando sobre eles suas próprias necessidades e inseguranças. Juntos, eles formam um grupo de pessoas que querem apenas se sentirem amadas e admiradas, e que reagem agressivamente quando não conseguem o que querem.
Assim como na vida real, é difícil dizer para onde esses personagens vão daqui para frente. O único que dá sinais de previsibilidade é Connor, que parece estar seguindo a mesma trajetória de Donald Trump. Como já escrevi aqui:
[Connor] é claramente inspirado em Donald Trump, o filho idiota que não tem senso do ridículo e que pretende se tornar presidente. Assim como Connor, Trump sempre teve baixa credibilidade dentro da família mas uma considerável presença na mídia, conquistando um perfil público muito diferente das suas reais capacidades. E assim como Trump, Connor consegue conquistar a simpatia de uma parte dos conservadores, os chamados con-heads, claramente baseados nos alt-right do mundo real.
A possibilidade de ele se casar com Willa (Justine Lupe) é mais uma evidência nesse sentido, o que faria dela sua Melania Trump. Se esse roteiro for seguido, Connor, mesmo sem o apoio da família, eventualmente fará proveito das fragilidades da democracia dos EUA e mergulhará os Roy no caos de uma eleição presidencial.
Apesar das muitas influências, Succession já conseguiu criar seu próprio estilo de drama, ainda que lembre alguns dos momentos mais marcantes de séries de comédia como Veep e Bojack Horseman (resenha aqui). Além de inteligente e divertida, essa é uma trama que vai tão fundo na psique de seus personagens que chega ao limite de servir como um espelho para o público, levando o espectador a se emocionar não apenas pelos personagens, mas também por si mesmo.