Crítica: A Garota da Vez

Woman of the Hour, EUA, 2023



Trailer · Letterboxd · IMDB · RottenTomatoes

★★★★☆


Apesar de não ser um filme de terror, A Garota da Vez é um dos filmes mais aterrorizantes do ano. A diretora estreante Anna Kendrick e o roteirista Ian McDonald costuram uma narrativa inquietante para contar a história real de uma chocante série de assassinatos nos anos 1970. Mais que isso, o filme sobrepõe a “leveza” da misoginia do dia a dia com o pesadelo vivido por mulheres atacadas por um psicopata.

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Em 1978, o assassino em série Rodney Alcala (Daniel Zovatto) foi um dos participantes no programa televisivo de relacionamentos The Dating Game, no qual uma mulher solteira escolhe entre três candidatos para ter um encontro romântico. Sem saber, milhões de americanos presenciaram a aspirante a atriz Cheryl Bradshaw (Kendrick) interagindo com um criminoso que já possuía várias passagens pela polícia e já havia assassinado várias (talvez dezenas de) mulheres.

Ao adotar Cheryl como protagonista e utilizar a participação no programa como enquadramento para a história, a trama realça o desamparo das mulheres em um mundo que lhes impõe regras degradantes e não as leva a sério como seres humanos. Essa temática é comum em outras produções sobre criminosos em série da vida real, como a minissérie Inacreditável e o filme Holy Spider.

No caso de Holy Spider, o assassino chega a contar com a simpatia de parte da população, já que ele está assassinando prostitutas. Em A Garota da Vez, a misoginia não é tão explícita, mas o efeito é similar.

Por um lado, pode-se dizer que Alcala possui um transtorno mental que o torna violento e perigoso. Por outro lado, a sociedade na qual ele está inserido permite que ele continue fazendo vítimas apesar de já ter exibido um comportamento repetitivamente violento contra mulheres e crianças. Seu primeiro crime conhecido foi um ataque extremamente violento contra uma menina de oito anos de idade, em 1968.

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Quando participou do The Dating Game em 1978, Alcala já havia sido um dos dez criminosos mais procurados na lista do FBI, além de ter sido condenado a prisão e solto duas vezes em liberdade condicional, sempre por crimes cometidos contra mulheres e meninas. E, ainda assim, sua participação em um programa exibido em rede nacional de televisão não teve maiores repercussões.

Mesmo depois da prisão mostrada no ato final de A Garota da Vez, Alcala ainda faria mais vítimas em 1979, depois de sua mãe pagar sua fiança. Ele só seria definitivamente preso quando as autoridades o prenderam pelo assassinato brutal de uma menina de doze anos de idade. Nas décadas seguintes, ele tentou reverter várias de suas condenações, mas, graças às evoluções nas técnicas forenses de análise de DNA, ele foi conectado a vários outros assassinatos não resolvidos.

Dessa forma, A Garota da Vez não é realmente sobre a participação de um serial killer em um programa de TV, mas sim sobre o quão longe esse criminoso conseguiu ir apesar de ter sido preso várias vezes. A dificuldade para se conseguir condená-lo definitivamente lembra a história real contada no filme Sangue no Gelo, que também mostra como a misoginia dificulta a captura de um assassino em série.

Como suspense, A Garota da Vez representa uma estreia fenomenal da atriz Anna Kendrick na direção. Ao intercalar as interações de Cheryl antes e durante o programa com os crimes cometidos por Alcala, ela cria uma dinâmica na qual o desconforto se mantém constante. A mensagem principal do filme é transmitida não por meio de palavras ou mesmo de acontecimentos, mas sim pelos diferentes tipos de tensão presentes em cada uma das interações da protagonista com os homens ao seu redor.

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